4 de maio de 2013

Campeões do Passado: Max Euwe

O quinto campeão do mundo foi um homem incrível. Em seu interior, apresentava uma honestidade rara e altruísmo sempre que possível. No meio profissional foi matemático, engenheiro, astrônomo, especialista em computadores e em seus últimos anos presidente da FIDE.



Ele também ajudou o Xadrez de diversas formas. Chegou ao título de campeão do mundo quase... sem desejá-lo! Em seus métodos de estudo estavam: estudar profundamente os problemas da transição da abertura para o meio-jogo e a elaboração da teoria do final - o mesmo escreveu um livro muito interessante chamado "técnica de finais" disponível em português. Foi um jogador tático que buscou ser estrategista a todo custo.



Seu match com Alekhine foi surreal. Euwe era o único que poderia vencer o campeão em 1935. Mas antes de destacar esse momento histórico é necessário voltar um pouco antes. Alekhine se preparava para jogar com Capablanca em 1927. Ele fez um match de treinamento de 10 partidas com Euwe, o qual venceu por apenas +3 -2 =5. Euwe, onde já vinha se destacando vencendo torneios internacionais, a partir desse momento sentiu que poderia ir mais longe. Segue uma partida com domínio estratégico de Max após sacríficio de peão. " Não vence aquele que joga bem, mas aquele que joga melhor. "






No verão de 1929 após ganhar com tranquilidade seu 3o campeonato nacional (8,5 em 9), Doutor Euwe foi a Carlsbad onde era realizado um dos torneios mais fortes. Ficou em uma razoável colocação. No ano seguinte venceu o torneio de Hastings mostrando sua força ao mundo e posteriormente enfrentou capablanca em um match amistoso de dez partidas. Perdeu duas e empatou 8 deixando escapar duas vitórias. Capablanca afirmou: "Este é indubitavelmente um dos mais fortes jogadores hoje."

Em 1933 Euwe pensava mais em dar aulas do que em jogar. Na realidade sempre foi assim, porém ele estava em seu auge! Em uma conversa com seu amigo Kmoch ao final de 1933, Euwe falara que poderia largar o Xadrez, mas Kmoch o convenceu de antes disso, lutar pelo título mundial!! Dentro de dois anos fariam uma preparação minuciosa contra Alekhine. Na holanda havia o "comitê Euwe" que tratava o professor como herói e usava todos os meios para fazê-lo ir à frente cada vez mais. O comitê não tardou a conseguir o investimento necessário, Alekhine ficou encantado.

A ordem era: quem conseguir 15,5 pontos com o mínimo de seis partidas ganhas seria consagrado o novo campeão mundial. O perdedor teria direito ao match-revanche.
Antes do campeonato mundial, em 1934 aconteceu o supertorneio de Zurique. Alekhine estava em forma! Ganhou com 13 em 15. Euwe e Flohr dividiram o segundo lugar com 11,5.

No outono de 1935, em Amsterdã, chega o GRANDE MOMENTO. Era considerado pelo mundo um confronto " Davi e Golas " ! Havia expressos para a Holanda denominados "Alekhine-Euwe". Ao andar do match os jornais explodiam com cada detalhe e atraía cada vez mais apaixonados pelo esporte. Euwe contribuiu muito com sua força contínua e resistência até o fim.



Alekhine começou devastador com o placar de 5-2. Uma curiosidade bizarra: Alekhine levava consigo dois gatos, chamados Lobeidah e Chess. Na segunda parte do match antes de cada partida deixava os gatos no tabuleiro, as vezes inclusive durante o jogo. Euwe dizia que essas coisinhas não iriam desconcentrá-lo e por isso não reclamou. Não demorou muito para Euwe reduzir a diferença. Em uma partida a mão de Alekhine tremia enquanto movia a dama, ele percebeu que perderia. O humor dos jogadores havia trocado! Os espectadores notavam. 

Na partida 12 Alexander moveu a peça errada no oitavo lance! 1.d4-Cf6 2.c4-g6 3.Cc3-d5 4.Dxb3-dxc4 5.Dxc4-Bg7 6.e4-0-0 7.Cf3-a6 8.Bf4-b5 , hoje em dia "b5" é teórico! Alekhine havia acertado sem querer!! Ele anotou c6, mas tocou no outro peão e foi obrigado a jogar b5; "Que trágico", escreveu Kotov. Ele se encontrava nervoso e jogava imprudentemente em várias partidas. Para assombro do mundo tudo estava empatado em 7-7. 

Alekhine disse a Lasker recuperando sua sensatez: "Jogarei mais sólido, prudente e lógico." Agora ele lutaria como um simples soldado, não como um Deus. Assim fez valer o placar de 10-8. 

Mas... como um guerreiro Euwe empatou o match com uma técnica absurda. Com duas vitórias seguidas, uma de brancas e outra de negras. Isso causou uma forte angústia no campeão. Ele errou um lance fácil em um final ganhador! Tudo estava conspirando a favor do candidato. Alekhine quando ficava nervoso bebia mais que o normal. Muitos dizem que isso o atrapalhou, mas a escolha foi dele em não se ver em condições de se controlar. Ele estava em choque perdendo sua orientação emocional, antes tão nítida. 

Euwe joga pela primeira vez no match a abertura Cambridge Springs, e esta lhe deu sorte! Ele passa o placar, 13-12!! A Holanda estava exultante com seu herói dominando pela primeira vez o match. 


1. d4 d5 2. c4 c6 3. Nf3 Nf6 4. Nc3 e6 5. Bg5 Nbd7 6. e3 Qa5 7. cxd5 (7.Cd2) Nxd5 8. Qd2 N7b6 9. Bd3 Nxc3 10. bxc3 Nd5 11. Rc1 (melhor é 0-0) Nxc3 12. O-O Bb4 13. a3 Qxa3 14. Ra1 Qb3 15. Bc2 (os sacrifícios foram corretos mas esse lance é péssimo, correto é Ce5 ou Tfc1, são encontrados em muitos livros) Qd5 16. e4 Nxe4 17. Qxb4 Nxg5 18. Ne5 a5 19. Qa3 f6 20. Bg6+ hxg6 21. Nxg6 Nf3+ 0-1

Em seguida Euwe joga uma partida maravilhosa em uma defesa Holandesa (Alekhine, de fato, não homenageou a Holanda). Mais uma vitória pro desafiante, 14-12!! Vamos ver:


Que energia e criatividade!! Houve dois empates em seguida, 15-14!! Só faltava meio ponto!
Euwe jogou a Defesa Alekhine na penúltima... Palavras de Alexander " Minha Abertura... toda minha carreira desfilava, tive de lutar contra ela e fechar o círculo com minhas próprias mãos."

Para disputar a partida que encerrava o match (Amsterdã, final de 1935), quando ambos sentavam Euwe disse: Estou disposto a aceitar empate a qualquer momento". Alekhine disse: "Necessito ganhar". Mas atacou, podemos dizer loucamente e se encontrou em uma posição perdida no lance 40. Naquela época eles adiavam nesse momento para o dia seguinte onde era denominado o "lance secreto". Alexander lhou para Max e disse: "Temos que adiar ou devo felicitá-lo agora, me diga."
Eles se puseram de pé e deram as mãos. Havia lágrimas nos olhos de Alekhine, ele encontrou força e gritou: Hurra pelo novo campeão! Longa vida ao xadrez holandês!!" Em resposta, a multidão, após aclamar Euwe, começou a cantar A Marselhesa, junto com o próprio Alekhine.




Trinta anos depois...

Em 1970 a FIDE decidiu colocar em andamento o até então "match do século" (o qual falaremos na sequência da série Campeões do Passado) entre Spassky e Fischer. Onde tratava-se de um selecionado russo, a nata mundial, e um do resto do mundo. Spassky propôs Euwe para o posto de presidente da FIDE, não é nem preciso dizer que ele foi eleito unanimemente. Ele faleceu em 1981. Sempre foi um homem honesto sem favorecer ninguém, procurava ajudar a todos e se preocupar em ensinar. Viajou muito para exercer seus projetos. 

Max fez de tudo para Bobby Fischer enfrentar Karpov, não foi suficiente. Ele disse para Karpov: " Você não será Rei só hoje, acredite ". E assim foi, Karpov se consagrou campeão mundial jogando contra Korchnoi. Outro gesto com palavras de Max foi quando mandou um telegrama para Petrosian, após perder para Spassky: " Não perca o sorriso".

Ele amou o Xadrez com todas suas forças. 



Agradecimento: Ao amigo André Kemper, por pedir para eu ajudar quando possível com posts criativos, o qual faço com muito prazer.

Sobre o post: Max Euwe foi honesto e parcial. Talentoso, profissional e digno. Procurei ler sobre seu jogo mas fiquei impressionado ao ler sobre sua pessoa. Se ele dedicasse todas suas forças como Bobby Fischer, não faço ideia até onde ele iria chegar. Vou colocar todo mês um campeão do passado, com curiosidades e momentos históricos, fiquem de olho! 

Abraços,
David Yunes